Brasilianas.Org:
Amazônia: pecuária lidera desflorestamento
Por Bruno de Pierro, no Brasilianas.org
Da Agência Dinheiro Vivo
A maior parte das áreas desflorestadas na Amazônia, até 2008, é ocupada pela pecuária. De um total de 719 mil km² de território desflorestado – maior que a área da França, de aproximadamente 544 mil km² -, 62% são utilizados para pastagem, e apenas 5% correspondem à agricultura anual, baseada no uso de alta tecnologia. Os dados compõem o estudo TerraClass, realizado pela Embrapa e o Inpe e divulgado no dia 2 de setembro.
Com base nas informações geradas pelo Prodes, projeto de monitoramento do desflorestamento na Amazônia Legal, feito anualmente pelo Inpe, o estudo realizou a qualificação das áreas que foram desflorestas até 2008, e mesmo daquelas que foram regeneradas – o que, de acordo com a metodologia adotada, ainda são consideradas devastadas.
A maior concentração de áreas de pastagens está no Estado de Rondônia, cerca de 80% da cobertura florestal transformada. Já as áreas de agricultura anual, onde predominam culturas de ciclo anual, como grãos, e são empregados padrões tecnológicos elevados, representam 35 mil quilômetros das áreas desflorestadas. Segundo o levantamento, Mato Grosso se destaca nessa atividade. O Estado tem 15% das áreas devastadas ocupadas por agricultura anual; acima do comparativo geral da Amazônia, de 5%.
No Estado do Pará, em suas áreas desflorestadas o predomínio é de pastagens (62%), sendo que, do total de áreas mapeadas como mineração na Amazônia, a metade delas está no Estado.
O Terraclass mapeou 18% do bioma amazônico já desmatados, gerando uma classificação dos diversos usos e situações, em cada um dos nove Estados da região. As análises foram feitas a partir de informações resultantes do levantamento detalhado do desflorestamento ocorrido até 2008, obtidas pelo Prodes.
O dilema
Uma informação importante revelada pelo TerraClass diz respeito à recuperação de áreas desflorestadas. Hoje, na Amazônia, 20% do território que foi cortado (18% da região) estão regenerados, mas isso ainda não foi descontado da cota de emissão de gases, ou seja, trata-se de um dado até então desconhecido. Mas essa porcentagem de nova vegetação, chamada de vegetação secundária, ou capoeira, não significa que a floresta tenha se recomposto tal qual era na sua formação original – a vegetação primária.
Na verdade, ela nunca volta a ser uma floresta com a quantidade de carbono e a biodiversidade que possuía. Entretanto, a vegetação secundária exerce papel fundamental, longe de ser adjetivado como “secundário”, pois emite vapor d’água para a atmosfera e, embora em menor proporção, fixando uma quantidade considerável de carbono.
Mas a notícia sobre a regeneração já lança questionamentos quanto à importância econômica das capoeiras: não é melhor usar essas áreas, que já foram antes utilizadas, do que desmatar aquilo que ainda se mantém como vegetação primária, intocada, se quisermos expandir a atividade agropecuária?
De acordo com Adriano Venturieri, pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, esse cenário pode ser a opção, quando se esgotarem as áreas de pastos sujos, regiões desflorestadas e abandonadas, que, se recuperadas, podem voltar a ser exploradas pelo agronegócio. Atualmente, a área de pasto sujo na Amazônia é de aproximadamente 63 mil km², representando 8,7% do total de área desflorestada. No Pará, por exemplo, a proporção é maior: do total de área desflorestada, 10% é de pasto sujo, enquanto que 44% correspondem a pastagens e outros 10% à regeneração com pasto.
Para Venturieri, a prioridade deve ser o uso, com prévia recuperação, dos pastos sujos. Contudo, nos próximos anos, quando estes pastos estiverem ocupados, a expansão da produção dará de frente com um dilema: devastamos floresta primária ou floresta secundária? “Num cenário em que os pastos sujos foram usados, podemos usar as áreas regeneradas, pois é melhor do que derrubar floresta nova”, defende o pesquisador, ao explicar que, nesse caso, seriam priorizadas as capoeiras mais jovens, com mais ou menos cinco anos. “A capoeira faz parte do sistema de produção do pequeno produtor, tem sobrevida curta”, completa.
Crescer sem desmatar
Outro ponto levantado é com relação ao aprimoramento de tecnologias capazes de aumentar a produção nas áreas hoje disponíveis. Muitos produtores de pequeno e médio porte optam pela expansão territorial quando decidem aumentar o número de cabeças de gado ou multiplicar os hectares cultivados, o que exige novos desmatamentos. Isso porque os recursos tecnológicos que permitem a expansão, sem a necessidade de aumentar a área, exigem grandes investimentos, inclusive em pesquisa.
“Tem muita área ainda, talvez uns 10 milhões de hectares, que ainda podem ser utilizados em diferentes tipos de atividades, sejam elas de agricultura familiar ou não”, afirma Paulo Moutinho, diretor-executivo do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia). Segundo Moutinho, deve-se fazer o possível para que as capoeiras (vegetação secundária) sejam preservadas, devido à função ecológica. “Se você remove essas áreas que são restauradas naturalmente, depois do abandono, você tem que ter um critério claro para fazer isso”, explica. Neste caso, é preciso investir em tecnologias e programas para a recuperação do solo dos pastos sujos e o restabelecimento da agricultura.
Venturieri, da Embrapa, concorda que seja possível duplicar, ou até triplicar, a produção em territórios já existentes, e afirma que o Brasil possui tecnologia para isso. Entretanto, enfatiza a falta de recursos da maioria dos agricultores. “Não se faz por falta de investimentos”, afirma. Entre as atividades caras estão o manejo de pastagens e o melhor desenvolvimento genético do rebanho.
Moutinho observa que a agricultura familiar, responsável por 80% dos alimentos produzidos nas cidades amazônicas, utiliza uma tecnologia muito básica e ocupa uma área de aproximadamente 6%. “O fator limitante é como utilizar a área, como criar programas de recuperação e como incentivar a intensificação de pastagens e distribuir esse passivo ambiental para aqueles que tem condições de produzir”, argumenta.
Evidentemente, a questão fundiária está no centro do debate, e por isso Moutinho mostra a necessidade do Estado brasileiro criar políticas de conservação, aliadas com políticas de incentivo ao uso de pastos sujos. Destaca, ainda, a necessidade de novos estudos, a partir dos dados do TerraClass, que tenham por objetivo entender a ligação entre as diferentes classes criadas, pois o fato da agricultura não cumprir uma área muito grande, não significa que ela não tenha um papel no desmatamento, afinal ela está ligada à pecuária. Hoje, são plantados grãos de soja, que empurram o boi para dentro da floresta, por exemplo.
“Com o TerraClass sabemos as áreas, agora precisamos saber as diferenças entre cada classe e a interação entre uma classe e outra”, conclui.
Imagens:
– Enviado usando a Barra de Ferramentas Google
Amazônia: pecuária lidera desflorestamento
Por Bruno de Pierro, no Brasilianas.org
Da Agência Dinheiro Vivo
A maior parte das áreas desflorestadas na Amazônia, até 2008, é ocupada pela pecuária. De um total de 719 mil km² de território desflorestado – maior que a área da França, de aproximadamente 544 mil km² -, 62% são utilizados para pastagem, e apenas 5% correspondem à agricultura anual, baseada no uso de alta tecnologia. Os dados compõem o estudo TerraClass, realizado pela Embrapa e o Inpe e divulgado no dia 2 de setembro.
Com base nas informações geradas pelo Prodes, projeto de monitoramento do desflorestamento na Amazônia Legal, feito anualmente pelo Inpe, o estudo realizou a qualificação das áreas que foram desflorestas até 2008, e mesmo daquelas que foram regeneradas – o que, de acordo com a metodologia adotada, ainda são consideradas devastadas.
A maior concentração de áreas de pastagens está no Estado de Rondônia, cerca de 80% da cobertura florestal transformada. Já as áreas de agricultura anual, onde predominam culturas de ciclo anual, como grãos, e são empregados padrões tecnológicos elevados, representam 35 mil quilômetros das áreas desflorestadas. Segundo o levantamento, Mato Grosso se destaca nessa atividade. O Estado tem 15% das áreas devastadas ocupadas por agricultura anual; acima do comparativo geral da Amazônia, de 5%.
No Estado do Pará, em suas áreas desflorestadas o predomínio é de pastagens (62%), sendo que, do total de áreas mapeadas como mineração na Amazônia, a metade delas está no Estado.
O Terraclass mapeou 18% do bioma amazônico já desmatados, gerando uma classificação dos diversos usos e situações, em cada um dos nove Estados da região. As análises foram feitas a partir de informações resultantes do levantamento detalhado do desflorestamento ocorrido até 2008, obtidas pelo Prodes.
O dilema
Uma informação importante revelada pelo TerraClass diz respeito à recuperação de áreas desflorestadas. Hoje, na Amazônia, 20% do território que foi cortado (18% da região) estão regenerados, mas isso ainda não foi descontado da cota de emissão de gases, ou seja, trata-se de um dado até então desconhecido. Mas essa porcentagem de nova vegetação, chamada de vegetação secundária, ou capoeira, não significa que a floresta tenha se recomposto tal qual era na sua formação original – a vegetação primária.
Na verdade, ela nunca volta a ser uma floresta com a quantidade de carbono e a biodiversidade que possuía. Entretanto, a vegetação secundária exerce papel fundamental, longe de ser adjetivado como “secundário”, pois emite vapor d’água para a atmosfera e, embora em menor proporção, fixando uma quantidade considerável de carbono.
Mas a notícia sobre a regeneração já lança questionamentos quanto à importância econômica das capoeiras: não é melhor usar essas áreas, que já foram antes utilizadas, do que desmatar aquilo que ainda se mantém como vegetação primária, intocada, se quisermos expandir a atividade agropecuária?
De acordo com Adriano Venturieri, pesquisador da Embrapa Amazônia Oriental, esse cenário pode ser a opção, quando se esgotarem as áreas de pastos sujos, regiões desflorestadas e abandonadas, que, se recuperadas, podem voltar a ser exploradas pelo agronegócio. Atualmente, a área de pasto sujo na Amazônia é de aproximadamente 63 mil km², representando 8,7% do total de área desflorestada. No Pará, por exemplo, a proporção é maior: do total de área desflorestada, 10% é de pasto sujo, enquanto que 44% correspondem a pastagens e outros 10% à regeneração com pasto.
Para Venturieri, a prioridade deve ser o uso, com prévia recuperação, dos pastos sujos. Contudo, nos próximos anos, quando estes pastos estiverem ocupados, a expansão da produção dará de frente com um dilema: devastamos floresta primária ou floresta secundária? “Num cenário em que os pastos sujos foram usados, podemos usar as áreas regeneradas, pois é melhor do que derrubar floresta nova”, defende o pesquisador, ao explicar que, nesse caso, seriam priorizadas as capoeiras mais jovens, com mais ou menos cinco anos. “A capoeira faz parte do sistema de produção do pequeno produtor, tem sobrevida curta”, completa.
Crescer sem desmatar
Outro ponto levantado é com relação ao aprimoramento de tecnologias capazes de aumentar a produção nas áreas hoje disponíveis. Muitos produtores de pequeno e médio porte optam pela expansão territorial quando decidem aumentar o número de cabeças de gado ou multiplicar os hectares cultivados, o que exige novos desmatamentos. Isso porque os recursos tecnológicos que permitem a expansão, sem a necessidade de aumentar a área, exigem grandes investimentos, inclusive em pesquisa.
“Tem muita área ainda, talvez uns 10 milhões de hectares, que ainda podem ser utilizados em diferentes tipos de atividades, sejam elas de agricultura familiar ou não”, afirma Paulo Moutinho, diretor-executivo do IPAM (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia). Segundo Moutinho, deve-se fazer o possível para que as capoeiras (vegetação secundária) sejam preservadas, devido à função ecológica. “Se você remove essas áreas que são restauradas naturalmente, depois do abandono, você tem que ter um critério claro para fazer isso”, explica. Neste caso, é preciso investir em tecnologias e programas para a recuperação do solo dos pastos sujos e o restabelecimento da agricultura.
Venturieri, da Embrapa, concorda que seja possível duplicar, ou até triplicar, a produção em territórios já existentes, e afirma que o Brasil possui tecnologia para isso. Entretanto, enfatiza a falta de recursos da maioria dos agricultores. “Não se faz por falta de investimentos”, afirma. Entre as atividades caras estão o manejo de pastagens e o melhor desenvolvimento genético do rebanho.
Moutinho observa que a agricultura familiar, responsável por 80% dos alimentos produzidos nas cidades amazônicas, utiliza uma tecnologia muito básica e ocupa uma área de aproximadamente 6%. “O fator limitante é como utilizar a área, como criar programas de recuperação e como incentivar a intensificação de pastagens e distribuir esse passivo ambiental para aqueles que tem condições de produzir”, argumenta.
Evidentemente, a questão fundiária está no centro do debate, e por isso Moutinho mostra a necessidade do Estado brasileiro criar políticas de conservação, aliadas com políticas de incentivo ao uso de pastos sujos. Destaca, ainda, a necessidade de novos estudos, a partir dos dados do TerraClass, que tenham por objetivo entender a ligação entre as diferentes classes criadas, pois o fato da agricultura não cumprir uma área muito grande, não significa que ela não tenha um papel no desmatamento, afinal ela está ligada à pecuária. Hoje, são plantados grãos de soja, que empurram o boi para dentro da floresta, por exemplo.
“Com o TerraClass sabemos as áreas, agora precisamos saber as diferenças entre cada classe e a interação entre uma classe e outra”, conclui.
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