domingo, 18 de setembro de 2011

Futuro da navegação na região amazônica

Acritica.com - Manaus - Amazonas:
A navegação nos rios da Amazônia ganhou um novo personagem e com ele vieram desafios, perigos e procedimentos tão ou mais complexos do que os existentes na época do naufrágio do barco motor Sobral Santos, há 30 anos, no porto do município de Óbidos, no Oeste do Pará, quando cumpria a linha Santarém-Manaus.

Trata-se das lanchas rápidas conhecidas por “a jato”. “Elas são o futuro mesmo, mas minha preocupação é que ainda não foram estabelecidas condutas para situação de risco com a maior presença delas nos rios. O risco não está mapeado e, com isso, não há condutas preescritas para mitigá-lo”, avalia a Engenheira de Produção Nadja Vanessa Miranda Lins, estudiosa do tema navegação e construção naval na região.

As lanchas conquistaram um público pela rapidez com que cumprem trechos longos de navegação, principalmente a partir de Manaus ou Santarém. Entre Manaus e Parintins, por exemplo, barcos recreio levam, em média, 18 horas de viagem descendo o rio, quando a viagem é mais rápida. Já nas lanchas, subindo o rio (trecho mais demorado), o trecho é cumprido em apenas oito horas.

Outra vantagem está no conforto e na qualidade dos serviços oferecidos neste tipo de embarcações. Nas lanchas os passageiros, em média 100, viajam acomodados em poltronas amplas, confortáveis, com travesseiros e em salão climatizado. O serviço de bordo é outra atração a parte pela qualidade. Na linha acompanhada pela reportagem de A CRÍTICA, no último trecho da viagem de Belém a Manaus, foi servido um lanche no meio da manhã e um almoço por volta de meio dia.

O serviço funciona como se fosse num avião, tripulantes passam com um carrinho, servem a comida numa bandeja e oferecem refrigerante, sucos ou água. Tudo isso já incluso no preço da passagem, R$ 150,00 de Parintins a Manaus. Além desse serviço, há um bar na popa onde há biscoitos, chocolates, refrigerantes, cervejas e sanduiches rápidos. A higiene dos banheiros também contrasta com a dos recreios e catamarãs tradicionais.

Para passar o tempo a lancha é dotada de 10 tvs de tela LCD plana na qual são passados filmes legendados, o que facilita o entendimento do passageiros, pois o som natural acaba abafado pelo barulho do motor. “Vamos assistindo televisão e ai o tempo passa rápido”, diz o advogado Julião de Souza, que seguia na mesma viagem da reportagem.

De Santarém também partem lanchas rápidas para diversos municípios do entorno, mas a diferença é que a alimentação é cobrada e o projeto da embarcação assemelha-se mais a um ônibus do que propriamente a um barco, como as lanchas que operam no Amazonas. Essas lanchas-ônibus saem de Santarém e atendem todos os municípios do baixo Amazonas paraense, como Óbidos, Oriximiná, Juruti e Porto Trombetas. No Pará ou no Amazonas, apenas um procedimento de segurança é igual, todas partem nas primeiras horas da manhã para cumprir toda a linha ainda com o dia claro. “Este é um procedimento de segurança padrão, quando têm de navegar à noite, em função da potencia dos motores, os pilotos diminuem a velocidade e só despejam potência máxima quando o dia clareia”, conta Nadja.

Nadja Vanessa Miranda Lins - Engenheira e estudiosa da navegação na amazônica

O naufrágio do Sobral Santos completa hoje 30 anos. Esse tipo de embarcação ainda tem vez na Amazônia?

Os barcos recreios são seguros e atendem bem às necessidades dos passageiros. Eu fiz uma pesquisa com meus alunos no ano passado e chegamos a um número de 290 registro de acidentes por ano na Amazônia, desde os mais simples até os naufrágios. Então, o índice de acidentes não é tão grande e, infelizmente, a maioria deles é causada por falhas humanas, às vezes, em sequência como no caso do barco Carolina do Norte.

Qual foi o caso deste acidente?

Ali houve a junção de problemas de construção naval e falhas humanas em sequência. O barco saiu da Manaus Moderna já com um problema, mas o comandante achou que dava, mas na altura do Educandos parou. Ai o comandante procurou um estaleiro para fazer o conserto, pediu aos passageiros para deixar o barco, mas eles não quiseram com medo de perder seus lugares. Falha humana do comandante e dos passageiros, que colocaram a própria vida em risco. Ali tinha que suspender o barco (numa carreira), o primeiro estaleiro não aceitou fazer o serviço com os passageiros dentro, um segundo aceitou. Nova falha humana e o resultado é que o barco virou e matou algumas pessoas. Infelizmente, ouvi isso de um comandante, o amazonense tem a cultura de risco.

Os barcos de aço são mais seguros que os de madeira?

Não. Essa história de mudar de madeira para aço, na minha opinião é um lobby da indústria do aço. Penso que fazer barcos de aço é recomendável para quem pensa em quantidades expressivas de passageiros, tipo 700 ou 800, mas um barco para 200 passageiros estará bem servido e seguro com casco de madeira, que ao contrário do que muitos pensam, tem grande resistência, principalmente itaúba e cumaru, são muito duras. O que me preocupa nesse debate é que estão fazendo barcos de aço do mesmo jeito que faziam barcos de madeira. Ai pode ter problemas.

Quais os problemas que a senhora identifica na navegação e como resolvê-lo?

Falta segurança nos serviço de navegação. É preciso ensinar itens de qualidade para os tripulantes, eles precisam ter noções de qualidade para que possam, por exemplo, melhorar a manutenção preventiva. Hoje ela é reativa, só trocam uma peça quando ela quebra. É preciso capacitar as pessoas para qualidade durante o transcorrer na navegação. Isso é um processo que está começando, tome o exemplo da Lancha Cristal, lá é algo de primeira. Outro problema que precisa ser atacado é o da navegabilidade, não temos rotas certas nos rios da Amazônia, os rios são navegáveis, mas não há sinalização, não há hidrovias. O tráfego cresceu, há comboios de balsas, há lanchas rápidas, barcos recreios, navios graneleiros, petroleiros, tudo isso navegando ao mesmo tempo e o risco aumenta. As estatísticas mostram que tem crescido, principalmente, acidentes entre balsas e barcos. Isso é fruto da falta de sinalização.

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