Santayana: “Lula é doutor em política” e Guilherme, aos 11 anos, já sabia | Maria Frô:
"Nunca me esqueço de um um aluno querido da escola da Vila, Guilherme, quando estava na quinta-série em meados da década de 1990.
Era um debate sobre eleições e os alunos deveriam defender seus candidatos de preferência. Guilherme debatia e propôs o seguinte exercício para a sala: Para ser médico você precisa estudar o quê? A sala respondia: Medicina. E pra ser engenheiro?, ele prosseguia e a sala: Engenharia. Para ser arquiteto? A sala: Arquitetura; e advogado? A sala novamente: Direito.
Finalmente, ele pergunta: “E pra ser presidente?” Um silêncio imenso na sala. Daí ele diz, algo assim: pra ser presidente precisa fazer faculdade do povo, conhecer bem o povo, os seus problemas, não precisa de diploma universitário para ser presidente, precisa de sensibilidade e compromisso com o povo.
Guilherme era um aluno impressionante, surpreendia-me sempre. Na quinta-série ele já sabia o que os preconceituosos jamais aprenderão sobre democracia e, por isso, jamais reconhecerão a grandeza de Lula e passarão sempre esta vergonha alheia que Aleluia passou.
De olhos opacos no turbilhão do mundo
Por: Mauro Santayana no JB
O engenheiro baiano José Carlos Aleluia enviou carta ao Reitor da Universidade de Coimbra, protestando contra a concessão do título de Doutor Honoris-Causa ao operário Luis Inácio da Silva, que, com o apelido afetivo de Lula, presidiu ao Brasil durante oito anos. Sem mandato, Aleluia mantém contatos com seus eleitores, mediante um site na Internet.
Ele foi um oposicionista inquieto, ocupando, sempre que podia, a tribuna, no ataque ao governo passado, dentro da linha sem rumo e sem prumo do DEM. Aleluia considera uma ofensa às instituições acadêmicas o título concedido a Lula, e faz referência elogiosa à mesma homenagem prestada ao professor Miguel Reale. Esqueceu-se, é certo, de outros brasileiros honrados pela vetusta universidade, como Tancredo Neves. Não é preciso conhecer a teoria de Freud para compreender a escolha da memória de Aleluia.
O título universitário é, hoje, licença profissional corporativa. O senhor Aleluia está diplomado para exercer o ofício de engenheiro. A Universidade o preparou para entender das ciências físicas, e é provável que ele seja profissional competente, tanto é assim que ministra aulas. O título universitário certifica que o graduado estudou tal ou qual matéria, mas não faz dele um sábio. O conhecimento adquirido na universidade é importante, mas não é tudo. Volto a citar, porque a idéia deve ser repetida, os versos de um escritor mais identificado com a direita do que com a esquerda, T.S. Elliot, nos quais ele mostra a diferença entre ser informado, conhecer e saber: Where is the wisdom we have lost in knowledge? Where is the knowledge we have lost in information? (Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento? Onde está o conhecimento que perdemos na informação?)
O título de Doutor Honoris-Causa, sabe bem disso o engenheiro Aleluia, não é licença profissional, mas o reconhecimento de um saber, construído ao longo do tempo, tenha o agraciado ou não freqüentado a universidade. O papel da Universidade não deveria ser o que vem desempenhando – o de conferir certificados de preparação técnica -, mas o de abrir caminho à busca do saber. O Senador Christovam Buarque, com a autoridade de quem foi reitor da UNB, disse certa vez que a Universidade ideal será aquela que não expeça diplomas.
Lula, com os seus defeitos, e não são poucos, é um doutor em política. Um chefe de Estado não administra cifras, não faz cálculos estruturais, não prolata sentenças, nem deve escrever seus próprios discursos. Cabe-lhe liderar os povos e conduzir os estados, e isso dele exige muito mais do que qualquer formação escolar: exige a sabedoria que desconfia do conhecimento, e o conhecimento que se esquiva das informações não confiáveis.
A universidade é uma instituição relativamente nova na História. Ela não foi necessária para que os homens, com Demócrito, intuíssem a física atômica; com Pitágoras e Euclides, riscassem no solo figuras geométricas e delas abstraíssem os teoremas matemáticos; e muito menos para que Fídias fosse o genial arquiteto e engenheiro das obras da Acrópole e o escultor que foi. Mais ainda: as maiores revoluções intelectuais e sociais do mundo não dependeram das universidades, embora nelas se tenham formado grandes pensadores – e sua importância, como centro de reflexões e pesquisas, seja insubstituível. O preconceito de classe contra Lula sela os olhos de Aleluia e os torna opacos.
Solidário o meu autodidatismo com o de Lula, quero lembrar o grande escritor norte-americano Ralph Waldo Emerson: um talento pode formar-se na obscuridade, mas um caráter só se forma no turbilhão do mundo.
É no turbilhão do mundo que se forma o caráter dos grandes homens.
PS.: E agora, a Universidade de Salamanca, na Espanha, que está entre as cinco mais antigas do mundo, fundada em 1218, acaba de aprovar, por unanimidade, o título de doutor honoris causa a Lula (notícia de 31/03/2011).
– Enviado usando a Barra de Ferramentas Google"
"Nunca me esqueço de um um aluno querido da escola da Vila, Guilherme, quando estava na quinta-série em meados da década de 1990.
Era um debate sobre eleições e os alunos deveriam defender seus candidatos de preferência. Guilherme debatia e propôs o seguinte exercício para a sala: Para ser médico você precisa estudar o quê? A sala respondia: Medicina. E pra ser engenheiro?, ele prosseguia e a sala: Engenharia. Para ser arquiteto? A sala: Arquitetura; e advogado? A sala novamente: Direito.
Finalmente, ele pergunta: “E pra ser presidente?” Um silêncio imenso na sala. Daí ele diz, algo assim: pra ser presidente precisa fazer faculdade do povo, conhecer bem o povo, os seus problemas, não precisa de diploma universitário para ser presidente, precisa de sensibilidade e compromisso com o povo.
Guilherme era um aluno impressionante, surpreendia-me sempre. Na quinta-série ele já sabia o que os preconceituosos jamais aprenderão sobre democracia e, por isso, jamais reconhecerão a grandeza de Lula e passarão sempre esta vergonha alheia que Aleluia passou.
Ex-presidente Lula durante a cerimônia na Universidade de Coimbra na qual recebeu o título de Doutor Honoris-Causa. |
De olhos opacos no turbilhão do mundo
Por: Mauro Santayana no JB
O engenheiro baiano José Carlos Aleluia enviou carta ao Reitor da Universidade de Coimbra, protestando contra a concessão do título de Doutor Honoris-Causa ao operário Luis Inácio da Silva, que, com o apelido afetivo de Lula, presidiu ao Brasil durante oito anos. Sem mandato, Aleluia mantém contatos com seus eleitores, mediante um site na Internet.
Ele foi um oposicionista inquieto, ocupando, sempre que podia, a tribuna, no ataque ao governo passado, dentro da linha sem rumo e sem prumo do DEM. Aleluia considera uma ofensa às instituições acadêmicas o título concedido a Lula, e faz referência elogiosa à mesma homenagem prestada ao professor Miguel Reale. Esqueceu-se, é certo, de outros brasileiros honrados pela vetusta universidade, como Tancredo Neves. Não é preciso conhecer a teoria de Freud para compreender a escolha da memória de Aleluia.
O título universitário é, hoje, licença profissional corporativa. O senhor Aleluia está diplomado para exercer o ofício de engenheiro. A Universidade o preparou para entender das ciências físicas, e é provável que ele seja profissional competente, tanto é assim que ministra aulas. O título universitário certifica que o graduado estudou tal ou qual matéria, mas não faz dele um sábio. O conhecimento adquirido na universidade é importante, mas não é tudo. Volto a citar, porque a idéia deve ser repetida, os versos de um escritor mais identificado com a direita do que com a esquerda, T.S. Elliot, nos quais ele mostra a diferença entre ser informado, conhecer e saber: Where is the wisdom we have lost in knowledge? Where is the knowledge we have lost in information? (Onde está a sabedoria que perdemos no conhecimento? Onde está o conhecimento que perdemos na informação?)
O título de Doutor Honoris-Causa, sabe bem disso o engenheiro Aleluia, não é licença profissional, mas o reconhecimento de um saber, construído ao longo do tempo, tenha o agraciado ou não freqüentado a universidade. O papel da Universidade não deveria ser o que vem desempenhando – o de conferir certificados de preparação técnica -, mas o de abrir caminho à busca do saber. O Senador Christovam Buarque, com a autoridade de quem foi reitor da UNB, disse certa vez que a Universidade ideal será aquela que não expeça diplomas.
Lula, com os seus defeitos, e não são poucos, é um doutor em política. Um chefe de Estado não administra cifras, não faz cálculos estruturais, não prolata sentenças, nem deve escrever seus próprios discursos. Cabe-lhe liderar os povos e conduzir os estados, e isso dele exige muito mais do que qualquer formação escolar: exige a sabedoria que desconfia do conhecimento, e o conhecimento que se esquiva das informações não confiáveis.
A universidade é uma instituição relativamente nova na História. Ela não foi necessária para que os homens, com Demócrito, intuíssem a física atômica; com Pitágoras e Euclides, riscassem no solo figuras geométricas e delas abstraíssem os teoremas matemáticos; e muito menos para que Fídias fosse o genial arquiteto e engenheiro das obras da Acrópole e o escultor que foi. Mais ainda: as maiores revoluções intelectuais e sociais do mundo não dependeram das universidades, embora nelas se tenham formado grandes pensadores – e sua importância, como centro de reflexões e pesquisas, seja insubstituível. O preconceito de classe contra Lula sela os olhos de Aleluia e os torna opacos.
Solidário o meu autodidatismo com o de Lula, quero lembrar o grande escritor norte-americano Ralph Waldo Emerson: um talento pode formar-se na obscuridade, mas um caráter só se forma no turbilhão do mundo.
É no turbilhão do mundo que se forma o caráter dos grandes homens.
PS.: E agora, a Universidade de Salamanca, na Espanha, que está entre as cinco mais antigas do mundo, fundada em 1218, acaba de aprovar, por unanimidade, o título de doutor honoris causa a Lula (notícia de 31/03/2011).
– Enviado usando a Barra de Ferramentas Google"
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